Novembro de 1930. Alemanha.
Os censores assistem a um novo filme de guerra, chamado Sem Novidade No Front, uma promessa de sucesso imenso nos cinemas ao redor do mundo. Após pequenos cortes, o filme é lançado na Alemanha.
5 de dezembro – 1930.
No cinema, enquanto acontecia a estreia do filme, protestantes do partido Nazistas faziam diversas manifestações em frente a sala, jogando bombas e tentando parar a exibição, até que um Joseph Goebbels, o futuro ministro da propaganda de Hitler conseguiu parar a sessão.
Mesmo Hitler considerava o filme como algo ameaçador. Mas o que tem nesse filme que enfureceu tanto os nazistas?
Eu vou te contar agora!
Sem Novidade no Front é um filme de 1930, o terceiro ganhador do Oscar de Melhor Filme. Conta a história de vários rapazes alemães, que incentivados por seu professor se alistam para participar da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), com a promessa de trazerem orgulho para os pais e chamar a atenção das moças. Porém, quando eles de fato chegam à guerra, descobrem que não é nada como imaginaram.
- Particularmente- eu achei esse um dos melhores filmes de guerra que já assisti. Se a maioria dos longas do gênero trazem uma visão heróica de uma guerra, Sem Novidade No Front mostra uma outra perspectiva: uma guerra cruel, que mata pessoas que sequer sabem o motivo pelo qual estão lutando, enquanto os causadores da guerra estão em suas respectivas casas opinando sobre algo que nem sabem como é na verdade.
O filme começa com o professor fazendo um discurso inflamado de como os soldados da guerra são heróis, e como os meninos devem estar dispostos a se sacrificarem por seu país. Pouco a pouco, ele convence todos os meninos a se alistarem. Parece com os discursos de alguém? Pois é. O professor usa EXATAMENTE o tipo de discurso que o Hitler usava e descrevia no seu livro Minha Luta. Hitler acreditava, essencialmente, no poder da oratória para convencer a população a fazer o que ele queria, e o filme mostrava os perigos nesse tipo de discurso. Imagina o ódio que ele deve ter ficado quando assistiu né?
Existem algumas frases marcantes do filme que particularmente impactaram os nazistas, fazendo com que eles quisessem sumir com todas as cópias que iam ser exibidas na Alemanha:
“Ele diz a vocês: “Vão lá e morram!!” . Ah, mas se vocês me permitem, é mais fácil dizer “vão lá e morram” do que fazer isso! E é mais fácil falar do que ver acontecer!”
“- Eu acho que talvez o Kaiser quisesse uma guerra.
- Não acho. O Kaiser já tem tudo o que precisa.
- Bom, ele ainda não havia tido uma guerra até então. Todo imperador que se preze precisa de uma guerra que o torne famoso. Afinal, a história é assim!”
Ou seja, o filme destruía todos os ideais que Hitler vinha construindo para criar uma Alemanha forte o suficiente para entrar em uma nova guerra, o que iria acontecer em 1939.
Os membros do partido nazista recorreram aos censores novamente, pedindo que o filme fosse retirado dos cinemas alemães, já que ele mostrava estereótipos perigosos do povo e eram ofensivos, além de entediar o público com tantas mortes.
Esse episódio, conhecido como A Guerra dos Filmes, foi vencido pela Alemanha e Sem Novidade No Front foi retirado do cinema.
Acontece que o diretor da Universal, Carl Laemmle, era alemão e gostaria muito que o filme fosse exibido em seu país e pediu para um jornalista, William Randolph Hearst (conhece Cidadão Kane? Foi inspirado na vida desse cidadão aqui), defender o filme como algo pacifista que deveria ser exibido nos cinemas da Alemanha.
Foram tantos artigos que Hearst escreveu, que finalmente o filme seria exibido na Alemanha, porém com muito mais cortes do que o resto das cópias exibidas ao redor do mundo.
Laemmle se arrependeu de ter cedido tanto para os nazistas, visto que Hitler chegaria ao poder logo em seguida, e o resto do que aconteceu vocês já conhecem: Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Ele pediu que Hearst escrevesse um novo artigo, dessa vez defendendo o filme sem cortes, o que nunca aconteceu.
Porém, essa não foi a única vez que Hollywood editou e censurou seus filmes para que fossem exibidos na Alemanha Nazista, que era um dos públicos mais fiéis do cinema americano (o próprio Hitler era muito fã de cinema, chegando a oferecer um prêmio pela captura de Clark Gable quando descobriu que o ator havia se alistado), mas bem, isso é história para um próximo post!
O que na história poderia ter sido diferente se Sem Novidade No Front tivesse sido exibido em seu formato original na Alemanha Nazista? Será que não teriam caído com tanta facilidade nas falácias hitleristas? Ou tudo teria acontecido da mesma forma?
É incrível conhecer o poder de um filme, não é mesmo?
Espero que tenham gostado!
Fonte:
Livro – O Pacto Entre Hollywood e o Nazismo – Como o Cinema Americano Colaborou com a Alemanha de Hitler, de Ben Urwand.